viagens...

para registar e partilhar relatos de viagens: as reais e as resultantes das minhas leituras... :)

25 março 2006

Jane Eyre

Uma viagem à Inglaterra vitoriana, pela mão de Charlotte Brontë.

Esta é, acima de tudo, uma história de amor, mas é também muito mais do que isso: se eu tivesse a capacidade de analisar e interpretar as várias dimensões do romance, poderia, com certeza, retirar mensagens políticas, sociais e religiosas... como não tenho, limito-me a olhar a sua camada mais superficial... :)

Antes de mais, acho que a história está muito bem contada. O relato chega-nos na primeira pessoa, pela voz da personagem principal, que não se limita a narrar os acontecimentos passados, mas deita sobre eles o olhar que a distância temporal e as experiências posteriores lhe consentem.
O relato na primeira pessoa, pontuado por intimistas dear readers, faz com que nos sintamos desde logo identificados com a Jane: sofremos e revoltamo-nos com ela, pelas injustiças de que é alvo; orgulhamo-nos das suas pequenas vitórias, das suas capacidades e inteligência, do sucesso que obtém nas actividades a que se dedica; damos por nós a torcer para que a vida lhe sorria e encontre finalmente a felicidade a que tem direito...

Charlotte começou por assinar o livro com um nome ambíguo (Currer Bell) para não correr o risco de ver a sua publicação rejeitada por ter sido escrito por uma mulher.
Parece que ela introduziu algumas inovações com esta obra, nomeadamente ao adoptar uma heroína sem as características das heroínas habituais nos romances da época e ao oferecer ao leitor o acompanhamento do crescimento da narradora, apresentando o evoluir da sua percepção da realidade desde os 10 anos.

Apesar de apresentar algumas ideias marcadamente feministas, o livro deixa transparecer ainda alguns preconceitos tidos como verdades inquestionáveis na sociedade vitoriana:
-as capacidades inferiores (e os poucos direitos) das pessoas oriundas de classes sociais mais baixas, patente, por exemplo na atitude de Jane para com os seus alunos em Morton;
-a inferioridade do "sangue" crioulo, que transparece no relato da história da primeira Mrs Rochester;
-a superioridade da educação inglesa ("As she grew up, a sound English education corrected in a great measure her French defects;...").

Interessantes também, as coincidências de que Charlotte se socorre, para resolver imbróglios narrativos:
-o facto do cunhado do Mr Rochester conhecer o tio da Jane, permite que ele saiba por este, do casamento bígamo e chegue a tempo de o impedir;
-de todas as aldeias de toda a vasta Inglaterra a que a Jane poderia ter ido parar, ela vai encontrar abrigo precisamente na casa dos únicos primos que possui e cuja existência desconhecia, o que possibilita que venha a tomar conhecimento da herança que lhe está destinada e possa voltar a segurar nas mãos as rédeas do seu destino...
Será que Charlotte pretende com isto dizer que a mão de Deus está a guiar os passos de Jane? que Ele quer e abençoa a sua (e a nossa) felicidade terrena? :)

18 março 2006

Ainda Samarcanda...

Alguns momentos que ficaram da viagem à Pérsia do séc. XI:

.:crenças exóticas:.
"... uma grávida aborda Khayyam. De véu arregaçado, ela mal tem quinze anos. Sem uma palavra, sem um sorriso nos seus lábios ingénuos, tira-lhe das mãos uma pitada de amêndoas torradas que ele acabava de comprar. O passeante não se espanta, é uma antiga crença de Samarcanda: quando uma futura mãe encontra na rua um forasteiro que lhe agrada, ela deve ousar partilhar da sua comida, pois assim a criança será tão bela como ele, com a mesma silhueta esguia, os mesmos traços nobres e regulares."

.:descobertas científicas:.
"Antes de abater de novo o véu, ela levantou-o mais, soltando um olhar que Omar recolhe, aspira, gostaria de reter. Instante indiscernível para a turba, eternidade para o amante. O tempo tem dois rostos, diz consigo Khayyam, ele tem duas dimensões, a extensão é ao ritmo do sol, a espessura ao ritmo das paixões."

.:verdades intemporais:.
"... as qualidades que são precisas para governar não são as que se devem ter para subir ao poder. Para gerir bem os negócios públicos, é necessário esquecer-se de si mesmo, não se interessar senão pelos outros, sobretudo pelos mais infortunados; para chegar ao poder, é indispensável ser-se o mais ávido dos homens, só pensar em si mesmo, estar pronto a esmagar os amigos mais queridos."

A segunda parte do livro transporta-nos para o séc. XIX, onde acompanhamos um americano na busca de um manuscrito atribuído a Omar Khayyam. É uma Pérsia diferente que encontramos (agora já chamada de Irão), onde as tradições milenares tentam resistir às influências ocidentais. Aí assistimos impotentes ao sufoco das primeiras tentativas de instaurar a democracia, devido, principalmente, aos interesses de potências estrangeiras...


Uma das mais antigas cidades do mundo, Samarcanda fica actualmente no sul do Uzbequistão (pontinho preto no mapa). Em tempos uma cidade cosmopolita, situada em plena rota da seda, ela foi arrasada e abandonada à acção das areias do deserto, por várias vezes, nomeadamente aquando das invasões mongóis. Embora tenha perdido a importância política e económica de outrora, o seu nome tornou-se um símbolo mítico de uma sociedade desenvolvida, tolerante e pacífica e, em 2001, foi classificada pela UNESCO como Património da Humanidade.

15 março 2006

Olá!

Este é o meu primeiro post no meu primeiro blog... finalmente rendi-me ao fenómeno! Vamos ver qual vai ser a minha assiduidade.. :)

Com a leitura actual, encontro-me na Pérsia do séc. XI, a conviver com pessoas como Omar Khayyam (matemático, astrónomo, poeta, filósofo, médico e apreciador dos prazeres da vida) ou Hassan Sabbah (igualmente sábio mas asceta e fundador da seita dos Assassinos, termo adoptado depois no ocidente como sinónimo de homicida) e a assistir aos jogos de bastidores no governo dos impérios...

"O paraíso e o inferno estão dentro de ti" - Omar Khayyam